domingo, 28 de julho de 2019

INTRODUÇÃO


A compreensão do espaço em geral, como um meio dinâmico de estabelecer conexões e relações entre objetos e ações, põe em questionamento a concepção do espaço sagrado de forma estática. O ser humano, religioso ou não, é sempre agente transformador e em transformação, cria e recria os espaços em que sua existência acontece, conferindo-lhes novos e diferentes sentidos e significados. Segundo Santos ''o espaço é hoje um sistema de objetos cada vez mais artificiais, povoados por sistemas de ações igualmente imbuídos de artificialidade e cada vez mais tendentes a fins estranhos ao lugar de seus habitantes''. Algo especialmente notável na cena da espiritualidade atual. O espaço religioso, considerado sagrado, é também atingido por estas tendências, tornando-se indiferente, inclusive, ao homem religioso. Sob essa ótica, a compreensão de Mircea Eliade é limitada. O ser humano não precisa necessariamente sacralizar todo seu universo para a vivência de sua espiritualidade. A oposição entre sagrado e profano constitui-se numa artificialidade, uma vez que nem sempre é possível a divisão da realidade humana em duas esferas. 

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Há mulheres, muito poucas, que sabem tirar partido do olhar. Elas sabem emitir signos vindos do mais profundo universo inonimável. Já foi dito que “os olhos são as janelas da alma”, falando de outra maneira, os olhos têm uma relação de causa e efeito com o sistema-percepção. Isso foi assim revelado na escritura quando se diz: “os olhos são a lâmpada do corpo, se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo estará iluminado, se porém os teus olhos forem maus, todo o teu corpo estará em trevas”. Não se trataria apenas de um órgão para ver, mas de uma máquina de leitura do mundo pelos sentidos.

O Brasil possui heterogeneidades inéditas. A alegria que suscitamos aqui é oriunda da vertigem de emergir de uma inconstante sopa pré-biótica cósmica, vortex (epi)genético que goza dos mais múltiplos vetores: gens oriundos de todos os cantos do mundo se encontram no campo brasileiro, se estendendo para os gens anímicos da geografia e culturas mais heterogêneas, cadências rítmicas. O código genético se estende aos vivos inorgânicos traçando na acontecência a plena alegria de gerar novidade. Essa novidade que possui rumo incerto, esse não saber que se estende ao limiares epistemontológicos, gera nas entranhas da terra o mais pleno riso. Gargalhada no sentido que nela, se perde o controle do corpo, chega-se a chorar, atravessado pelos devires mais vertiginosos: a festa das intensidades ou dança dos vetores instáveis da novidade. Os vortexes gargalham do/no/por puro devir. A graça de não se controlar a acontecência, a alegria de não saber o que virá, a vertigem de intuir a expansão epistemontológica!

O Coringa se nega a encarar o que é problemático na seriedade de um Batman. A gargalhada cósmica tem seus percalços, é preciso muita seriedade e esforço para se chegar até ela. Muitas vezes, a melancolia é seu prenúncio. Se o Coringa se aliena dessa seriedade, desse esforço, ele se dicotomiza saindo de um ego neurótico (por exemplo, um Batman) para se esvair em Caos. A gargalhada cósmica opera de outra forma: a imanência é o Caos, não se esconde dele, funde-se a ele, elo místico de um vortex spinozista-bergsoniano, ou seja, apreender a imanência, a divindade caótica, ainda que instável.

Gargalhar cosmicamente por apreender a pintura abstrata (seus sentidos antes ocultos), por abraçar (enquanto enlace amoroso), por simplesmente criar, emergindo outras estÉticas. A gargalhada cósmica é nosso conceito mais precioso. É uma obviedade que emerja em vortexes brasileiros, mas para, eticamente, ressoar no cosmos. Para tanto, é preciso se aliar aos conceitos, adquirir vorticidade, vibrar as energias. Sabemos que o controle, os a prioris e a previsão (mas não a intuição) são tristes. Assim, urge que, sem diques, sejamos atravessados por devires, por vortexes.

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''O MUNDO DESPERTO. A HUMANIDADE EM MARCHA. NADA PODE DETÊ-LA. UMA HUMANIDADE CONSCIENTE, NEM EXPLORÁVEL NEM DIGNA DE PENA. EM MARCHA! EM FRENTE! ELES MARCHAM! MILHARES DE PÉS PISANDO, CALCANDO, BATENDO, PASSANDO INFINDAVELMENTE. RITMOS MUDAM. DEPRESSA, DEVAGAR, STACCATO, SE ARRASTANDO, CALCANDO, BATENDO, PASSANDO. EM FRENTE, O CRESCENDO FINAL DÁ A IMPRESSÃO DE QUE , CONFIANTE, IMPIEDOSO, O AVANÇO JAMAIS SE DETERÁ... PROJETANDO-SE NO ESPAÇO...

''VOZES NO CÉU, COMO MÁGICA, MÃOS INVISÍVEIS LIGANDO E DESLIGANDO BOTÕES DE RÁDIO FANTÁSTICOS, PREENCHENDO TODO O ESPAÇO, CRUZANDO-SE, SOBREPONDO-SE, INTERPRETANDO-SE, SEPARANDO-SE, SUPERPONDO-SE, REPELINDO-SE, COLIDINDO, CHOCANDO-SE. FRASES, SLOGANS, PRONUNCIAMENTOS, PALAVRAS DE ORDEM , PROCLAMAÇÕES: ESTADOS UNIDOS, CHINA, RÚSSIA, IRÃ, OS ESTADOS FASCISTAS E AS DEMOCRACIAS DE OPOSIÇÃO, TODOS ROMPENDO SUAS CROSTAS PARALISANTES COMO SE FOSSEM PELE HUMANA FERVIDA...''.

Mas que porra de proclamação é essa? De um anarquista ontológico desvairado? De um havaiano drogado indo para a quarta guerra mundial?

Não , meus amigos, são palavras de Edgar Varése, compositor. Ele está falando de uma de suas ''opus''. E tem mais:

''O que deve ser evitado: tom de propaganda, assim como qualquer especulação jornalística sobre eventos e doutrinas modernos. Quero um impacto épico sobre nossa época, despido de maneirismos e esnobismos. Sugiro usar aqui e ali retalhos de frases das revoluções americana, francesa, russa, alemã, chinesa, espanhola; assim como a frase de A DESOBEDIENCIA CIVIL , de Thoreau: ''A prisão é o único lugar onde um homem livre pode viver com honra'': estrelas cadentes, também palavras recorrentes como sonoras marteladas. Gostaria de um tom exultante, até profético, encantatório, a escrita, porém, nua, despida de ação, por assim dizer. Também algumas frasesdo folclore ----- devido a sua qualidade humana , pé no chão. Quero abranger tudo o que é humano, do mais primitivo aos mais distantes rincões da ciência''.

Podem-se prever as reações: ''Ele é louco'', dirão. Ou: ''O que é isso?'' ''Quem é esse Edgar Varése?!''

Para obeter informações reais sobre Edgar Varése e seu estilo lírico, recomendo o artigo de Paul Rosenfield no número de uma antiga revista chamada twice a year, antologia pulbicada duas vezes por ano na década de 1960. Lá voce encontrará Alfred Stieglitz guardando o forte. A propósito, é um lugar americano, sabe?, portanto, não há por que se alarmar. Rosenfeld escreveu com tamanha abragência e compreensão sobre a música de Varése que qualquer coisa que eu resolva dizer certamente soará redundante. O que me interessa em Varése é o fato de que ele parece incapaz de formar uma audiência. Está na mesma posição em que John Marin estaria hje, depois de cinquenta anos de trabalho ininterrupto, não fosse pela lealdade e devoção de seu grande amigo, Alfred Stieglitz. A situação relativa à Varése é ainda mais incompreensível, porque sua música é definitivamente a música do futuro. E o futuro já está aqui. Varése tornou sua música conhecida de uns poucos.

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''El fuego abriéndose paso es sentido por todos aquellos que no se han acostumbrado al estado ardiente. En consecuencia, cuando Yo recomiendo pensar en el Mundo Sutil, Yo estoy aconsejando algo muy útil y cuando Yo recomiendo pensar en los Mundos Ardientes, Yo estoy aconsejando algo indispensable. La afirmación del pensamiento ardiente es ya una adquisición invencible. Así como los eslabones de la cota de malla se engarzan gradualmente, así también crece invisible el plumaje ardiente''.

Agni Yoga
Mundos Ardentes


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Os valores que dependem desse velho elemento do negativo, os valores que caem sob a crítica radical, são todos os valores conhecidos ou conhecíveis até este dia. "Até este dia" designa o dia da transmutação. Mas o que significa: todos os valores conhecíveis? O niilismo é a negação como qualidade da vontade de poder. Entretanto, essa definição permanece insuficiente se não se leva em conta o papel e a função do niilismo: a vontade de poder aparece no homem e nele se faz conhecer como uma vontade de nada. E, para dizer a verdade, pouco saberíamos sobre a vontade de poder se não captássemos sua manifestação no ressentimento, na má consciência, no ideal ascético, no niilismo que nos força a conhecê-la. A vontade de poder é espírito, mas que saberíamos do espírito sem o espírito de vingança que nos revela estranhos poderes? A vontade de poder é corpo, mas o que saberíamos do corpo sem a doença que faz com que o conheçamos? Assim também o niilismo, a vontade de nada, não é apenas uma vontade de poder, uma qualidade de vontade de poder, mas a ratio cognoscendi da vontade de poder em geral. Todos os valores conhecidos e conhecíveis são, por natureza, valores que derivam dessa razão. – Se o niilismo nos faz conhecer a vontade de poder, esta nos ensina, inversamente, que ela nos é conhecida sob uma única forma, sob a forma do negativo que constitui apenas uma de suas faces, uma qualidade. Nós "pensamos" a vontade de poder sob uma forma distinta daquela sob a qual a conhecemos (assim o pensamento do eterno retorno ultrapassa todas as leis de nosso conhecimento). Longínqua sobrevivência dos temas de Kant e de Schope­nhauer: o que conhecemos da vontade de poder é também dor e suplício, mas a vontade de poder é ainda a alegria desconhecida, a felicidade desconhecida, o deus desconhecido. Ariana canta em sua queixa: "Eu me curvo e me torço, atormentada por todos os martírios eternos, atingida por ti, caçador mais cruel, tu, o deus – desconhecido... Fala, enfim, tu que te escondes atrás dos relâmpa­gos? Desconhecido! fala! Que queres... ? O volta, meu deus desconhecido! minha dor! minha última felicidade (68)." A outra face da vontade de poder, a face desconhecida, a outra qualidade da vontade de poder, a qualidade desconhecida: a afirmação. Esta, por sua vez, não é apenas uma vontade de poder, uma qualidade de vontade de poder, ela é ratio essendi da vontade de poder em geral. 

 "Tendo levado nele mesmo o niilismo até seu término, colocou-o atrás dele, abaixo dele, fora dele." 


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Esa introducción es crucial ya que desencadena un intercambio de las funciones narrativas fundamentales: narrador por narratario, lectores por personajes, deslizamientos que estratifican la narración en quiasmo, tramándola en dos planos cruzados: por superposición y oposición, ya que la estructura de "las ruinas circulares" no es sólo la articulación literaria fundamental de la arqueología imaginativa sino la apuesta en evidencia -portando su narrativa, su poética- de la fractura referencial, la inevitabilidad de la quiebra por el fenómeno de la significación. La representación como el punto donde se abre el abismo: el signo es el origen de otro signo, decía Ch. S. Peirce, reconociendo la ilimitación de la semiosis como el trámite que, por la quiebra, precipita el infinito.

Matheus Dulci

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