quarta-feira, 9 de outubro de 2019

De volta à questão do “yes” joyceano assombrado por espectros - LEITURA EMBRUXADA


l a temática do traço, recorrente de formas diversas em sua obra (“traço”, “suplemento”, “differance”, “segredo”, “cinza” “espectro”, “dádiva” podem e devem ser trabalhados como variações da temática da não-presença na presença

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Assombrados permanentemente pelo nada visível dos espectros, não podem ser desconstruídos porque já se desconstroem desde sempre. Mas é preciso acrescentar logo que essa desconstrução já existente não é privilégio do texto literário. O espectro que assombra a literatura assombra também outros textos. Na literatura, contudo, essa não-presença espectral torna-se particularmente visível. Como diz o próprio Derrida em Mémoires, for Paul de Man, “existe desde sempre desconstrução, operando em obras, especialmente em obras literárias” (DERRIDA, 1986). Talvez seja essa visibilidade maior da desconstrução na literatura que, no final das contas, justifique a resistência à interpretação, na medida do possível, em textos como o Ulysses, de Joyce. Mas, se no tratamento de Joyce não se justifica, na perspectiva de Derrida, nem a prática desconstrutiva e nem a prática interpretativa tradicional, resta ainda tentar precisar a natureza do texto derridiano sobre a literatura. Uma indicação dessa natureza aparece nos parágrafos finais do texto sobre o Ulysses.

O penúltimo parágrafo de “Ulysses Gramophone” retorna à questão do “yes” joyceano assombrado por espectros para afirmar que o termo “permanece recomeçando e repetindo se a si mesmo, um número infinito de vezes” . Derrida aponta aqui para a  lógica ferrenha da iterabilidade, possivelmente visível com força particular em Joyce, mas estruturalmente presente em qualquer signo, evento, coisa, origem ou presença. A presença de qualquer “yes”, em Joyce ou em qualquer outra situação, constitui um evento singular: acontece uma única vez e é absolutamente única em sua diferença em relação a qualquer outro “yes” no passado ou no futuro. Por outro lado, contudo, esse “yes” só pode existir em sua singularidade se já estiver desde sempre marcado pela lógica da iterabilidade, ou seja, pela condição de poder ser repetido de forma diferente e em outros contextos. Derrida lembra em “Signature, Event, Context” que “iter deriva de itara, other, em sânscrito” (DERRIDA). A estrutura da iterabilidade determina que em cada “yes” ou em cada singularidade habita desde sempre um outro espectral que a divide e a torna “plus d’un”: ao mesmo tempo “não um” e “mais do que um”. É a lógica da iterabilidade, de resto, que se faz presente em qualquer tipo de escrita (e não apenas na linguagem literária), seja ela “pictográfica, hieroglífica, ideográfica, fonética, alfabética” (DERRIDA) e que permite a essas linguagens operar independentemente de quem a recebe. “Uma escrita”, diz Derrida, “que não fosse estruturalmente legível – iterável – para além da morte do receptor não seria mais uma escrita” (DERRIDA). E permite também que operem independentemente do seu emissor ou produtor. “Escrever”, completa Derrida, “significa produzir uma espécie de máquina que se torna produtiva, e que não terá seu funcionamento impossibilitado pelo meu desaparecimento futuro” (DERRIDA,

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LEITURA EMBRUXADA


Entregue às palavras
na curva da noite,
oferta de leitura ao mistério
e desdém hierático
pelo mundo? E esses
ciúmes sapientes?
entre amores, autores e essências
o anoitecimento da alma
pressentido entre queixumes,
entre beijo e boca se evaporando.
Fixando as coisas que respiram,
seus interiores contestatórios
apareciam como fio central
e sem nome da suspeita,
zombando dos versos
e sua fissura por mulheres
que esfriam discursos.

--- Aqui é o tempo do dizível, nossa pátria ---
eu dizia
--- onde perecem as coisas vivíveis,
a chama de um doce limbo,
astúcia e coisas ao alcance
dentro do olhar, KAMA-MÍDIA ----

dados econômicos mistos de todo o mundo aumentaram as esperanças de mais estímulos dos bancos centrais para impedir uma recessão global.

Vaga pestana de olho fixo
fixando as coisas sem filtro,
sem mestre, na abertura do mundo
insinuando-se sem densidade,
pelas gretas das jaulas de pele;
KAMA continua ecoando.
Respira surdamente no mundo,
com seus interesses de drama
e de mercado --- uma rua,
um olho -- clama o escravo cognitivo,
mas sem o brilho da luta de classes,
some sem antídoto no escuro
do mundo sem nome, que se diverte
apenas fumando ou correndo
através de suas leituras.

Farol tímido, restrito ao olhar?
Compreensão e pedidos da Bruna:
no seu longo túnel de risos
alguma dialética negativa
atravessando o pescoço
e vindo grudar-se como musgo
nos objetos voadores do ego
--- no ar, ao vivo! --- entrando e
saindo do tempo, segundo rápidas
crispações de afeto mascarado,
etiquetados em tudo quanto
àquele ''humanero'' superfaturado,
pó de todas as coisas televisionadas.


Veio de mofa anti-conceitual?
Fingindo bem a todo poderosa
PALAVRA de autoridade indeterminada,
entre o tudo e o nada, no ENTRE
DA SUSPEITA, suspenso
nos limbos de gargantas dos livros,
buscando a coisa selvagem informulada
---- Aleph sub-júdice, comentário
do comentário místico... forçado? ---
enquanto ''mercadorias espreitam-me'' e
''o tempo ainda é de fezes'' e o
''mesmo impasse'' persiste ad nauseam.
Não é, minha Flor? Ler Le Nausee
e explicar-lhe o nada foi fácil,
mas sob a pele das palavras
era minha própria náusea,
sem poema nem filosofia,
e considerada sem ênfase,
quem afastava Sartre do assunto.
Os jornais seguiam ruminando
suas esperanças miúdas
em meio a um rio de negociações,
totalmente cúmplices
do Esquecimento do Ser
com sua política de políca publicitária.
E enquanto sequer se colocava
a pergunta do poeta pelo Ser,
o poeta lia-O, exercitava-se e banhava-se
nas águas de leitura do Ser,
meditando em catacumba heideggeriana
um futuro menos horroroso para seu estupor.
Livro. Nome. Advertência de poema exposto:
rizomaticamente ativo, e com os jornais
no lugar correto, o apontamento-grifo
embruxava totalmente a leitura.

Arquiescritura da mente,
num anoitecimento sonâmbulo
da linguagem e da imagem do mundo
que crispa o Mercado e suas interrogações.
Deriva impregnada de ermos da lua,
sem delicadeza, sem agasalho, sem
cigarros, tossindo entre prédios ---
frio central vadeado, um rio na
fome de traição da Natureza,
no seu célebre riso de chuva
e vento nas estradas, e nos
receios de ajuda dos homens,
suas suspeitas lentidões de láudano
em momentos de pose de estátuas,
suas sábias consultas, suspeitas
de olhos acesos recuando
''daquelas posições'',
tão sabidamente defendidas.

mATHEUS dULCI, KM

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