segunda-feira, 9 de setembro de 2019

LEITURA EMBRUXADA e outros textos novos em curso



LEITURA EMBRUXADA

Entregue às palavras
na curva da noite,
oferta de leitura ao mistério
e desdém hierático
pelo mundo? E esses
ciúmes sapientes?
entre amores, autores e essências
o anoitecimento da alma
pressentido entre queixumes,
entre beijo e boca se evaporando.
Fixando as coisas que respiram,
seus interiores contestatórios
apareciam como fio central
e sem nome da suspeita,
zombando dos versos
e sua fissura por mulheres
que esfriam discursos.

--- Aqui é o tempo do dizível, nossa pátria ---
eu dizia
--- onde perecem as coisas vivíveis,
a chama de um doce limbo,
astúcia e coisas ao alcance
dentro do olhar, KAMA-MÍDIA ----

dados econômicos mistos de todo o mundo aumentaram as esperanças de mais estímulos dos bancos centrais para impedir uma recessão global.

Vaga pestana de olho fixo
fixando as coisas sem filtro,
sem mestre, na abertura do mundo
insinuando-se sem densidade,
pelas gretas das jaulas de pele;
KAMA continua ecoando.
Respira surdamente no mundo,
com seus interesses de drama
e de mercado --- uma rua,
um olho -- clama o escravo cognitivo,
mas sem o brilho da luta de classes,
some sem antídoto no escuro
do mundo sem nome, que se diverte
apenas fumando ou correndo
através de suas leituras.

Farol tímido, restrito ao olhar?
Compreensão e pedidos da Bruna:
no seu longo túnel de risos
alguma dialética negativa
atravessando o pescoço
e vindo grudar-se como musgo
nos objetos voadores do ego
--- no ar, ao vivo! --- entrando e
saindo do tempo, segundo rápidas
crispações de afeto mascarado,
etiquetados em tudo quanto
àquele ''humanero'' superfaturado,
pó de todas as coisas televisionadas.


Veio de mofa anti-conceitual?
Fingindo bem a todo poderosa
PALAVRA de autoridade indeterminada,
entre o tudo e o nada, no ENTRE
DA SUSPEITA, suspenso
nos limbos de gargantas dos livros,
buscando a coisa selvagem informulada
---- Aleph sub-júdice, comentário
do comentário místico... forçado? ---
enquanto ''mercadorias espreitam-me'' e
''o tempo ainda é de fezes'' e o
''mesmo impasse'' persiste ad nauseam.
Não é, minha Flor? Ler Le Nausee
e explicar-lhe o nada foi fácil,
mas sob a pele das palavras
era minha própria náusea,
sem poema nem filosofia,
e considerada sem ênfase,
quem afastava Sartre do assunto.
Os jornais seguiam ruminando
suas esperanças miúdas
em meio a um rio de negociações,
totalmente cúmplices
do Esquecimento do Ser
com sua política de políca publicitária.
E enquanto sequer se colocava
a pergunta do poeta pelo Ser,
o poeta lia-O, exercitava-se e banhava-se
nas águas de leitura do Ser,
meditando em catacumba heideggeriana
um futuro menos horroroso para seu estupor.
Livro. Nome. Advertência de poema exposto:
rizomaticamente ativo, e com os jornais
no lugar correto, o apontamento-grifo
embruxava totalmente a leitura.

Arquiescritura da mente,
num anoitecimento sonâmbulo
da linguagem e da imagem do mundo
que crispa o Mercado e suas interrogações.
Deriva impregnada de ermos da lua,
sem delicadeza, sem agasalho, sem
cigarros, tossindo entre prédios ---
frio central vadeado, um rio na
fome de traição da Natureza,
no seu célebre riso de chuva
e vento nas estradas, e nos
receios de ajuda dos homens,
suas suspeitas lentidões de láudano
em momentos de pose de estátuas,
suas sábias consultas, suspeitas
de olhos acesos recuando
''daquelas posições'',
tão sabidamente defendidas.


UMA RETIFICAÇÃO DE ESTILO

Uma retificação do estilo, pois a linha política é primordial. A China estava começando a ficar repleta de fábricas ociosas, blocos de apartamentos vazios formando bairros fantasmas, estações de energias desativadas e outras obras de infraestrutura de quem ninguém mais precisava. Mas o governo parecia estar financiando ainda mais projetos dispendiosos.  Os investidores experientes da China estão nervosos. Até mesmo uma desvalorização drástica do yuan agora parece uma trombeta do Apocalipse. Eles não sabem o que estão fazendo. Ninguém sabe o que eles estão fazendo. E, principalmente, ninguém sabe o que fazer . Então: a filigrana encobrindo o gótico com um toque de retórica maoista no todo. ''IN HOC SIGNO VINCIS '', li isso num dos maços de cigarros que Gisele estava distribuindo: ''COM ESTE SINAL VENCEREMOS''. Eu estava confiante demais no meu próprio taco, mas as pesquisas eleitorais americanas eram esquizofrênicas. E minhas palavras já não eram palavras,  mas cheiro de gasolina militar: metade do meu discurso estava rascunhado na contra-capa de um livro sobre armamento soviético da época da Segunda Guerra Mundial, inadequado como se eu estivesse oferecendo conselhos à Aníbal: ''O tanque T-34 foi a salvação das Potências Aliadas (escrevi ali) Em Kusk eles derrubaram até os Porsches Elephants. E vocês não fazem idéia do que fizeram com o Quarto Exército Panzer. O general Koniev destroçou os tanques Tiger que os alemães tinham e seus Panthers usando o T-34. A cada  marca deixada pelos T-34, Koniev desenvolvia uma teoria nova, mais inteligente, mais empolgante e mais fodida das idéias. O T-34 permanecia um tema constante nos seus boletins de guerra. Seu sorriso cínico e monomaníaco tinha o ar do sorriso da morte.  Un sorriso malizioso ! Presbitericida. Audax. Libidinosus. Proditor. Raptor. Incendiarius.  A verdade é que, no duro, no duro, ele tinha um ''loop de feedback ' na cabeça que fazia com que aumentasse os ataques em vez de dosá-los. Parecia um mito grego. ----- O termo técnico teológico (não psiquiátrico) para isso é ''teofania ''. Não consiste em algo que aquele que percebe Deus faz. Consiste em algo que a Divindade faz. Moisés não criou a Sarça Ardente. Elias, no Monte Horeb, não gerou aquela voz que murmurava baixinho. Então, qual a diferença entre uma teofania e uma alucinação da parte percipiente (?) -----, Gisele indagou-me. ----- É a memória filogenética, enterrada na mente humana. Mas o tempo do homem atual está mal -ajustado para tanta ''novitá''. Confúcio queria voltar aos Ritos para restaurar o Paraíso Perdido da memória filogenética. O ''deus absconditus'', oculto e secreto. No Fragmento 54, Heráclito diz que ''a estrutura latente é Senhora da estrutura óbvia''. A Matéria é plástica em face da Mente. Baratinado e suando barba adentro, o tempo pode ser superado. Quando meus esforços retóricos atingirem o nível máximo de toxicidade, ouvirei estranhos estalos dentro da cabeça, como alguma coisa sobrecarregada: ''de litteris er de armis, praestantibusque ingenis ''; tanto dos tempos antigos , como do nosso: em suma, os assuntos comuns de conversa entre homens inteligentes. Objetos de linguagem empurrados até o ponto onde explodiam na ópera nunca escrita de Wagner sobre o Buda, que se chamaria (Die Sieger) Os Vencedores. Mircea Eliade diz que é possível penetrarmos no tempo dos heróis e seus feitos como se penetra numa festa para a qual não fomos convidados. E encontrar o Deus vivo ali tornará nossa DOXA muito forte, por meio das marcas de certos arquétipos. Pensamento vivo. Consciência política. Endividamento chinês. Aptidão analítica extraída dos interstícios do tecido esteriotipado das convenções discursivas. Ontem mesmo me perguntaram se eu já tinha lido Hegel: ora, um mestre categórico, um tanto mecanicista, enjoativo, mas um bocadinho de auto-suficiência nacional mergulhada em problemas neuróticos. As leitoras mais sensíveis terão de suportar qualquer brincadeira razoável que eu faça com elas. E poderão devolver a brincadeira desde que não exagerem. O IMPÉRIO NUNCA TERMINOU (!)



ECONOMÍMESIS

Os passos, amados ou odiados,
se calaram para desfilar na luz
apenas suas mais recônditas sombras.
Um aceno com a mão, de longe,
na penumbra do camarote, emudecia
o paraíso prometido com um riso de desdém.
Passados alguns dias, a Musa inconsciente
não se convertera em nada de valor.
Não passava agora de poeira nos dentes,
controle da máquina de outras namoradas
que apressavam na garganta a veloz golfada.


Eu havia renunciado à tudo, coando
café em horas estranhas, na casa que me
imobilizara, imobiliarizando-me.
Trocara a pior escolha pela falta de escolha,
escrevendo a palavra NÓS obliquamente,
para poupar minha poesia das minhas cartas,
que agora se liam em todas as cidades,
e de repente eu era o milagre adiado
da Poesia, Fenômeno ET Trans-teológico
infiltrado na Linguagem, orvalhando
petulantemente, sorrindo roteiros educado s
 e conformado num nicho conceitual estável
--- à caminho dos shows de tv? Neste exercício!


‘’Politicamente’’, diziam, ‘’suspeita-se de sua poesia
por causa de sua casa, da sanha de vazio cósmico
que parte de sua casa, poeta’’.

E havia força na declaração: minha poesia
era um retrato farto de sua fortaleza,
armada de frios riscos e sustos.
Eu dividira-me em tantos cursos diferentes
que os que me liam agora eram só, talvez,
variações de mim, que me aplaudiam
por só abaixar a cabeça (que pirraça!)
para amarrar os sapatos, ou abrir a caixa
de anfetaminas loucas das desgraças.

O mais puro exercício
do espírito-frila, armado
de linhas de frio e susto
entre tantos outros riscos.
Com caneta empesteada
no papel, essa peripécia
do pensamento estala as
molas de sua catraca, e
não retorna atarraxado
da própria duração de faquir...

A Mão Sinistra, essa mescla
energética de corpo e letra,
mantém na cerimônia
certa intimidade de
Sombra alastrada,
presidindo a Solitária vetorial
de todos os ioiôs do Ibope
entre a mutação dos riscos
e as sobremesas do Não-Ser,
com a caneta inserida no
corpo vedado da anti-matéria.
Ali, os veios que assinam o
Outro-Eu, dentro da conversa
muda do Poeta consigo mesmo,
surpreendem na parede outra Sombra
(aquela silhueta que se deixou
extrair da dentadura estetoscópica,
como se diz: a Sombra mimética,
ártica e insubmissa da Não-Ação).

E a Música? Vem desembainhando
O poema ácido, suado de medo.
Poema mareado, fechado e enluarado,
Sem, no entanto, morrer de sua
Própria repercussão solo --- o poema
Atravessa o dia, sentindo que sua retina
Testa o ultimato do espelho
A cada minuto, refletindo pancadas
Do que resta atingido, parado, correndo
Para dentro, através de estalos descuidados
Da cabeça. Contra Deus, lapso vertiginoso.
O poema se antecipa ao Evento, e se torna
O Poema, contra Deus e as bem comportadas
Maneiras corrompidas. Claro: custas processuais
Nascem desta nudez sem cerimônia, e certo
‘’chamamento’’’ à leitura grudenta
Que cospe sua baba no escuro ---
Indevido onanismo da meditação.

A partir da nuca, entreabrindo
Um belo banho adulto, de olhar fixo
Nas estrelas, a auto-aceleração seca
O Poema de todo nojo, e lavado,
Limpo e enxuto, seu novo uso
Se apressa contra a Espera.
Deus, dentro de uma cabeça
De rascunho, cozido por dentro.
Dura medida de Teofagia
Pela mão do Poeta, rigoroso
Em sua postura de indefinição.
Acenos graves do Poeta sem jeito,
Sem chance para arrepios.
Nirvana é seiva suada no escuro.



CONSULTEM XENÓFANES DE COLOTÃO!

 Gisele acusava minha linguística de não ser saussuriana. Espaço de manobra e velocidade para realizar acordos de qualquer natureza, mas com um parceiro de cada vez. Perfil de nação-comerciante mais pronunciado e ágil. Certamente o vácuo andara espreitando minhas palavras, mas aquele era um vácuo vivo. O amor daquele vácuo não tinha fronteiras, ao contrário do que se dizia. Apenas percorria o mundo por outras vias, fora dos relatórios sobre investimento global da UNCTAD e da OMC. Flutuando para sempre nos topóis republicanos, contra o lodo cheio de migalhas democratas assistencialistas e suas marcas de erosão. O Di Yin republicano contra a imundície cheia de bajuladores dos democratas. Corruptio, foetor, fungos. O Grande Yôgui Republicano apresentava agora seu canto sentimental ritmado, turvando o texto adversário com filologia nietzscheana. Os laudatores temporis aet a comentar que a bosta assistencialista já fôra mais escura e fértil, mas lamentando a petrificação eleitoreira da putrefação por uma nova carga de bosta cortada em losangos.... -----, páro de falar e olho para o meu chá: as folhas verdes se abriram bastante e formaram toda uma espessura no fundo da xícara. Di Yin... o assistencialismo cria um contexto de precarização salarial e extrema desigualdade para que o eleitorado torne-se dependente das políticas públicas que seguram os votos na Prisão de Ferro Negro. Couro de cortiço e aduladores numa grande rocha publicitária queixando-se de insuficiente atenção dos donos de notícias... Et Nulla Fidentia Inter eas. ------ Sugiro que vocês consultem Xenófanes (continuei: o Todo dele vê; o Todo dele pensa; o Todo dele ouve. O imóvel, viril, paralítico Purusha. Logo ,as pessoas estão iludidas (.) ------não apenas louco, mas totalmente louco. E eu não estou falando de uma Mente que dirige o Universo. Estou falando de uma Mente como aquela que Xenófanes de Colofão concebeu: não apenas louca, mas totalmente louca. Os gnósticos acreditavam que a Divindade Criadora era louca assim. Sobre a Origem do Mundo, de Orval Wintermute, tradutor dos códices da biblioteca de Nag Hammadi. Leia. O potinho Oh Ho. Procure saber dele. Então, fixei meus olhos no horizonte. Óleo mesclando-se à fuligem. A platéia aguardava. Quando Gisele operava no modo ''filha da puta'' começava a me interromper para falar de amor, gratidão eleitoral, direitos coletivos e programas assistencialistas, tudo que apequena uma nação. O Inferno se alimenta apenas de ''motivos elevados''. ------ Só me diga porquê , Gisele (?) -----, eu lhe perguntava.  Ao que  ela me respondia sem emoção: ----- Meus objetivos não podem ser conhecidos, ó homem (.) -----, as máscaras, no entanto, iam caindo como confetes, e a insídia dos motivos ulteriores se revelava.  Era uma coisa feia de se ver: à velocidade da luz, eu carregava o hemisfério direito do meu cérebro com uma quantidade titânica de gráficos demonstrando que a economia mundial estava mergulhada numa corrida protecionista inédita na história, e que a nação ficaria para trás no caso de mais uma década democrata. Gisele presumia serem aqueles gráficos lixo descartado, destroços nos quais mais ninguém reparava. Mas, espreitando, o Deus vivo emboscava a realidade por todos os lados e Gisele junto. Sim (eu berrava da tribuna) Jesus havia morrido para salvar os homens e as pessoas que não acreditavam nisso não sabiam o que estava rolando no mundo. O Universo inteiro estava mergulhado no processo invisível de se transformar no Senhor. Na Transubstanciação.


CRISE DE LEGIBILIDADE

As informações enfiadas na cabeça do povo em ondas sucessivas tinham uma origem sagrada em lugares-comuns escolhidos a dedo (topói e clichês divinos, análogos aos sub-programas que a cibernética chama de blocos). O Universo havia começado a falar com o povo, e este começara a tirar alguns sentidos do inescrutável. Desertos de Vasta Eternidade: o Logos. Arranjos e rearranjos: vemos os objetos do mundo físico como movimentos, mas não conseguimos ler seus padrões de disposição, ou extrair as informações dentro deles. Deveríamos ouvir essas informações como uma voz neutra dentro de nós. Mas nós nos tornamos idiotas com meia jornada inteiramente dedicada à política: não conseguimos lê-la por fora nem ouvi-la por dentro.



Matheus Dulci

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