quinta-feira, 12 de setembro de 2019

TEORIA DA VONTADE DOS CÉUS- ANGÚSTIA VERDE - TELEJORNAL -SÂNSCRITO DIABÓLICO -



TEORIA DA VONTADE DOS CÉUS

A mudança de Lancaster para York fôra agradável o suficiente para que Gisele sentisse uma elevação feliz na região abaixo do umbigo. Eu me perguntava agora o que poderia acontecer caso usássemos curare no decurso de uma de suas crises maníacas agudas ? Mas ela era rápida como um sabujo para pressentir quando haveria companhia feminina por perto. Não era só a campainha  da casa de York que a deixava alerta, agora. Era como quando levamos uma cotovelada nas costelas, sabe ? Começa-se a sentir calafrios e só se consegue pensar em enfiar a bunda na privada. E naquela manhã, aquela campainha atingiu minhas tripas em cheio, com um som borbulhante, um som que Gisele conseguira até mesmo farejar. Quando saí do banheiro, vislumbrei uma garota debruçada na janela da sala, me aguardando. Ela fôra enviada pelos sabichões de Nova York  para me ajudar a tanger os votos dos negros para dentro de um curral eleitoral onde (segundo ela) eu deveria oferecer um espetáculo de ventriloquismo no mínimo ''inovador''. ----- Mas Giovanna (eu disse) essa gente não aceita minha teoria da ''Vontade dos Céus'' pacificamente; muito menos a dos ''Funcionários sempre inteligentes e as massas sempre burras''. Andaram lendo o Anti-Duhring, de Engels, e seus rostos se converteram em dois tipos execráveis de cartazes ambulantes: ou realistas-banais ou panorâmicos-naifs. Preto no branco: as cores sem pulsões, como ''verossímeis'' demais ou de menos (.) ----, eu disse, enquanto meus passos me levavam até a porta. Sem café até o momento, seguia preso dentro do meu próprio crânio, totalmente lacrado... se não fossem pelos olhos dela, entende ? Mas, uma vez mais, o faro do sabujo não o havia traído. Gisele se plantou  no vão da porta que eu abrira para fumar, prematuramente ensandecida pelo ciúme, não demonstrando mais simpatia pela italiana quanto o olho de um caranguejo pendurado na extremidade de um pendúnculo. Não eram os olhos que eu precisava, naquela manhã. Giovanna tinha a mesma altura que ela, e feições tão lindas e agradáveis quanto as suas; mas era recatada, bem formada de corpo, com uma cabeça de cabelos castanhos abundantes e os os olhos mais azuis que eu já vira na vida . Fiz uma mesura quase imperceptível e, mesmo assim, os olhos de Gisele esguicharam como furúnculos estourados que lançam glóbulos de T.in-D para todos os lados e caem no chão da sala reproduzindo horrendas imagens de vingança aleatória. ----- A democracia é cancerosa (Giovanna disse) e a burocracia é o seu câncer; Ela cria raízes no Estado e se expande para reproduzir cada vez mais indivíduos à sua imagem e semelhança, cujas carências a justifiquem. Apenas as Cooperativas  conseguem viver desligadas do Estado, esse é o caminho a ser seguido (.) ------, rematou ela, misteriosamente.  Como eu precisava daqueles olhos ! Assim que me separei do poderoso abraço possessivo de Gisele, e de todo um conjunto de beijos vaporosos que ela deixou na minha boca com sua ciumenta saliva,  arrisquei uma nova mesura na direção de Giovanna. Giovanaa aproximou-se de mim e acrescentou, impassível: ----- Formação de unidades independentes para satisfazer as necessidades de quem colabora para o funcionamento dessas mesmas unidades. A burocracia estatal funciona com base no princípio inverso, ocupando-se de ''inventar necessidades'' que a façam ter sentido. Deus não pára de nos punir por nossos pecados (.) ------, só então percebi que ela estava nervosa. A Itália espetando a Alemanha ? Inenarrável: a conversa avançava como um carro de corrida sobre a multidão densa, organizada de desempregados e trabalhadores pobres da Europa, escoltados pelos Mil de Garibaldi dentro de sua mente. Fiz o que pude para acalma-la: ------ A política de crescimento da Alemanha é baseada no tipo ''empobreça seu vizinho '' e ''culpe a vítima '' quando o trem sair dos trilhos. Quando a demanda geral e o potencial de crescimento estremecerem, culpe a proteção do mercado de trabalho e as políticas públicas dos outros países, e não as reformas estruturais mal direcionadas da União Européia.



ANGÚSTIA VERDE

Existe uma ponte de idéias para
se chegar vivo à outra margem,
erguida à força de prognósticos

Comprovarás como é difícil, mas
seja impetuoso e desgarrado
com a caixa de câmbio, quando
estiver lidando com o que te pertence.

Enquanto estiver fazendo o balanço
de teus jugos, para desativar as lápides
do caminho, mira o flamboyant persuasivo:

as silhuetas clandestinas da tranquilidade
provocarão em ti a ''angústia verde''
da missão, para que melhor administres
a seiva promissora que se move ao sol.

.
Finca o olhar nela!, esse ponto de luz
''tamisada'', onde as mentiras começam
a se transformar... em nuvem, em pasto?

Procura averiguar isso friamente
na textura das notícias, não com os dentes!
Se chamarem à fala muitos ao mesmo tempo
a composição pode ficar estrangulada...
se começarem a reclamar demais de novo
devolva os reféns intactos dessa vez.
Queremos os seres-bois completos!



TELEJORNAL

Agora, para instalar meus dentes em ti,
a fome me obriga a repelir a gula...
seu rangido invisível tece, pula
contra o ar de toda angústia,
até achar uma posição cômoda
na qual filtrar as notícias do dia.

Tapeçaria onde as surpresas de linha e cor
retratam o mundo como intelecções sadias,
ou como oscilações de humor, como sentidos abertos
à flor das letras, onde as mentiras começam
a se transformar... em nuvem, em pasto?

Em amor cortês. TOCANTE!

Ali até as vossas críticas se fantasiam
no movimento rápido do teu aceno,
girando na rosa de teu nome, meu veneno!



SÂNSCRITO DIABÓLICO

I

Do sânscrito: KAMA, o alívio à
sensação dolente vinha na amada,
idolatrada saliva metafísica, tingindo
a história com seu tema glacial.

Explosão de verbos, sêmens, leites, suores,
servidos por bocas, sexos, seios, poros
dos quais em mim não restava vestígio.

Dentro de mim apenas o veio faminto
do Universo-Súcubo a girar, olho no olho,
desde a gruta secreta do desejo,
arrepio de toda ilusão.

Lava de olho eruptivo
pingando silêncio táctil,
derramando magmática
a voz do poeta no day after.

KAOS. ''Olho corredor'', além
das portas dilatando-se, acelerado,
em vitórias e derrotas demiúrgicas..

A voz do Demônio entra em cena.
Ligeira vantagem na apresentação,
na medida da yoga que vale a pena:

''Te julgas bela, inteligente e forte,
sendo só gostosa, mundana e instável.
Quero-te eterna, amada! Entanto és descartável''.

Fixando o teto, volve-se ao decúbito ventral.
Ela dorme, sua cabeça pendula no espaço sideral.
‘’O Demônio no meio da rua, num redemoinho’’.

O Demônio gira, deitando sobre seu lado esquerdo.
Os lábios dela babam trêmulos desejos.
O Demônio cola o queixo nela.
Bizarro altar de beijos.

Logo mais, o velho umbral da ''porta''
restará desgastado. Fala, pois, proclama:
ela era da mídia americana?

Era de se esperar, ao menos
algum Dragão inquietado por isto?
Não: o olvido invadia tudo
nas soluções de continuidade
geladas da tv. Destaques crus,

muita ação rápida na frente fria
e enxurradas de esperanças tardias
de lucro, suor de escassez, calafrios.

‘’Resistente à ânsia por novos achados,
ou conservando uma certa possibilidade Dela?’’,
perguntavam-me depois, zombando.

E de fato, toda a imprensa estrangeira
destacava meu rasgo sacrificial
IRONICAMENTE TÂNTRICO
dizendo que era possível encontrar um tal mártir
pontualmente às seis, instalado na cervejaria
com todas as suas vocações rentáveis
espionando as finanças do mundo
com uma sensibilidade expeditiva
absolutamente repugnante
ante um ‘’prato de presunto ao sol’’.

Inevitáveis zonas de presságio
que lambiam lealmente os restos de silêncio
em cada partícula de mundo
dispersa nos guardanapos.

Pairando, numa vertigem,
acima das torres de petróleo,
das missões de espionagem
e das mutações de onda curta
que vinham molestar
nosso triunfo em desordem.


II

A chantagem do homem extremado
injetava na terra a impotência calculista
de sua raiva, para nunca mais fecundá-la.

Mais livre, o Cowboy Solitário
perguntava-se se era agora cúmplice
de um fascínora. Mas o Cowboy

era apenas um cavalo treinado,
que desamarrava Susan
de um mau casamento
com os dentes, só para
continuar espiando-a no banho.

O trânsito dos pontos erógenos
recebia aquelas frutas de sêmen represado
como truques de distância
da mente,

no balcão da própria carne, como
energia? telepática
entre

rixas de prontidão

entre seres amados

sem vontade de perdoar?
uns aos outros e depois?


III

Enquanto os negócios nacionais prosperavam
à meias, a terra enchia-se de estranhos arsenais.

No Posto 6, a esferográfica do poeta
evitava o cerco bravamente, cercando-se
a si mesmo com as trevas mais longínquas.

A hora não é de ação (dizia ele)
mergulhado na fluida adrenalina
extática do Congresso,
onde arpões aglomeravam-se.

Matheus Dulci, KM

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